terça-feira, 1 de novembro de 2016

Ensina-nos a orar

APRENDENDO A ORAR




“A oração não se mostra verdadeira quando Deus escuta o que se lhe pede. Ela é verdadeira, quando quem ora continua orando, até que seja ele mesmo a escutar o que Deus quer. Quem ora de verdade, nada mais faz senão escutar.” [1]
Teocêntricos ou antropocêntricos? 

Se você quiser saber o conceito que um povo tem de Deus, preste atenção nas suas orações e nos seus cânticos. Pois é impossível ter um conceito correto de Deus revelado nas Escrituras e orar, cantar e adorar de maneira errada. Como sabemos, a teologia precede a ética, ou seja, o nosso comportamento, os nossos valores e prioridades são reflexos ou expressões do conceito que temos de Deus e da vida. Portanto, quanto mais conhecermos pelas Escrituras o Deus que se revelou na Pessoa de Jesus Cristo, quanto mais conhecermos o seu ser, os seus atributos, isto determinará a nossa maneira de orar, cantar e adorar a Deus.
Pode-se questionar: Seria possível adorar de maneira errada? Jesus disse que sim. Quando do seu encontro com a mulher samaritana, ele afirmou: “Vós adorais o que não conheceis.” Jo 4:22. Creio que um dos atributos de Deus que permeia todos os demais e que determina nosso relacionamento com Ele, através da oração e cânticos, é a soberania de Deus. Entretanto, a tendência hoje no meio cristão, é engrandecer o homem e degradar a Deus, chegando mesmo quase a divinizar o homem e humanizar a Deus. Pregamos um Deus limitado pela autonomia humana e, no dizer de R. K. Mc Gregor Wright, “Um Deus limitado pela autonomia humana, não é capaz de satisfazer as necessidades de um mundo perdido.”[2] Esta luta teve origem no Éden, quando Satanás fez o homem duvidar da palavra e do caráter de Deus. O homem perdeu o conceito correto da soberania de Deus, perdeu a visão de Deus como criador, e dele como criatura, levando-o a acreditar que poderia ser como Deus, que ele também é um ser autônomo. Essa luta entre o teocentrismo e o antropocentrismo, tem permeado toda a história humana. A. W. Pink diz: “Em toda a cristandade, com exceção que quase não pode ser levada em conta, mantém-se a teoria de que o homem determina a própria sorte e decide seu destino, através do seu “livre arbítrio”.”[3] Basta que prestemos atenção na maioria dos livros evangélicos escritos sobre oração, na maioria dos sermões pregados nas igrejas, nas letras dos cânticos, que iremos comprovar a triste realidade da centralidade humana
Uma reciclagem necessária 

A soberania de Deus sempre foi o tema central de toda a bíblia. Seu primeiro versículo proclama esta verdade: “No princípio criou Deus”. Veja ainda Is. 45:5-7; Dn 2:20,22; 4:34,35; I Cr 29:10-17; Rm 9: 14-26; Ap 4:11. A soberania de Deus sempre foi o tema de Paulo, Agostinho, dos pré-reformadores, dos reformadores, Lutero, Calvino, Zuinglio, sempre foi tema dos puritanos, e o tema central da teologia reformada. Portanto, somente uma reciclagem nesta verdade suprema poderá mudar nossas mentes, nossos conceitos, e conseqüentemente, nossas orações e cânticos. É de suma importância que aprendamos a orar e cantar com a Bíblia.
Orações na bíblia- Busca de uma vontade soberana
Vale a pena lermos e meditarmos a respeito do conteúdo das orações que a Bíblia registra. Veja Salomão orando- I Rs 3:5-10; 8:22-61. Examine a oração de Ezequiel no templo, II Rs 19:15-19; Is 37:14-20. Observe a visão da soberania de Deus e dos decretos eternos que tinha Davi, através da sua oração em II Sm 7:18-24; I Cr 17:16-27. Descubra o processo do trabalhar de Deus na vida de Jó, para que ele se dobrasse diante da soberania de Deus e aprendesse a orar. Veja sua oração no cap. 42: 1-6. Também podemos aprender a orar com o profeta Jeremias, reconhecendo a Deus como criador dos céus e da terra e como sustentador de tudo, Jr 32:16-25. Observe a oração de Daniel no exílio, Daniel capítulo 9, como também a oração de Esdras no capítulo 9, são orações que exaltam a soberania de Deus, seu plano eterno, orações que justificam a fidelidade, a misericórdia de Deus, que reconhecem a culpa humana. Todos eles oravam baseados na palavra, nas promessas de Deus, buscavam a vontade de Deus.
No Novo Testamento vamos encontrar também magníficas orações, a começar por aquela que Jesus ensinou atendendo ao oportuno pedido de seus discípulos, conhecida como a “Oração do Pai Nosso”, Mt. 6:9-13. Nela vemos delineados os princípios da oração e podemos dizer que todas as orações verdadeiras sem dúvida terão os princípios revelados nela, pois é uma oração teocêntrica, onde o tema principal é o Reino de Deus estabelecido na terra, através do seu nome santificado e a sua vontade feita na terra como é feita nos céus. Temos também em Mt. 26:36-44 a oração de Jesus no Getsêmani, onde Ele deixa vazar seu coração como homem e se coloca diante do Pai apresentando a sua vontade, mas se submete à vontade soberana de Deus. Temos ainda no capítulo 16 do evangelho de João, a conhecida oração sacerdotal, onde Jesus, o nosso Sumo Sacerdote, revela toda a sua missão de salvar os eleitos para Deus, deixando claro que Ele veio para um povo específico, e que Ele não somente tornou possível a salvação deste povo, mas que cumpriu o propósito eterno de Deus salvando realmente o seu povo. O verso 4 diz: “Eu te glorifiquei na terra consumando a obra que me confiaste para fazer.”
Jesus ensinou os seus discípulos a respeito do plano eterno e soberano de Deus, e eles passaram estas verdades aos primeiros cristãos. É o que podemos ver em Atos 4:23-31, quando a igreja primitiva está em oração. Eles começaram proclamando a soberania de Deus como criador e senhor de tudo. No verso 28 eles declaram que tudo o que aconteceu com Jesus fazia parte do propósito predeterminado por Deus. Podemos também ver a importância da visão correta da soberania de Deus, nas orações de Paulo, tanto pela igreja de Éfeso, Ef. 1:15-23; 3:14-21; como pelas demais igrejas, Cl 1:9-12; Fp 1:9; I Ts 3:11... Paulo sempre orava para que o Espírito Santo abrisse os olhos espirituais dos irmãos, dando-lhes sabedoria para compreenderem a vontade de Deus. Os textos demonstram claramente que a visão que Paulo possuía da soberania de Deus e do mistério que lhe fora revelado, determinavam suas orações.
Como oravam os pais da igreja? 

A história da igreja é testemunha de irmãos que através dos séculos, deixaram registradas suas orações manifestando de forma maravilhosa, esta visão correta a respeito de Deus e seu propósito. Um livreto que muito tem me ajudado e que eu aconselharia ao leitor adquirir, é uma coletânea de orações dos 20 séculos de história da igreja, intitulada: “Orações do povo de Cristo”, Editora Sinodal e Encontrão Editora. Neste livreto foram selecionadas as principais orações de cada século, orações feitas por irmãos que marcaram sua geração, creio que iremos aprender a orar com eles. Em todas estas orações podemos ver algo em comum: A visão correta da soberania de Deus e do seu eterno propósito. Eles sempre oravam para conhecer mais a Deus e pediam graça para realizar a sua vontade. Também creio ser indispensável meditar em outra obra sobre oração, intitulada: “Orando com os salmos”, do escritor alemão Dietrich Bonhoeffer, Encontrão Editora. Neste livro o autor nos ajuda a entender que a Bíblia é a palavra de Deus a nós, mas que os salmos são orações humanas inspiradas por Deus e dirigidas a Ele.
Dificuldades no aprendizado 

Hoje temos muita dificuldade para aprender a orar. Achamos que por sabermos falar, sabemos orar; e muitas vezes, nossas orações se assemelham mais as orações dos “gentios que não conhecem a Deus, e pensam que pelo muito falar serão ouvidos.” Mt 6:7,8. A falta de revelação de quem é Deus, e quem somos nós, nos conduz a grandes erros na oração. Ouça o conselho de Salomão em Ec 5:2: “Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus; porque Deus está nos céus, e tu, na terra; portanto, sejam poucas as tuas palavras.” Pior do que não orar é orar errado, é mais fácil ensinar quem não sabe orar do que quem já aprendeu errado. Bonhoeffer, nos ajuda entender isso, quando afirma: “Dizer que o coração é capaz de orar por natureza, é no entanto um equívoco perigoso, se bem que amplamente difundido na cristandade de hoje. Neste caso nós confundimos desejar, esperar suspirar, lamentar ou jubilar (de tudo isto nosso coração é capaz) com orar. Confundimos a terra com o céu, o ser humano com Deus. Orar não significa simplesmente derramar o coração, mas significa encontrar-se com o coração saturado ou vazio, o caminho para junto de Deus, e falar com Ele. Disto porém homem algum é capaz, para poder fazê-lo necessitamos de Jesus Cristo.” [4]
O que é orar em nome de Jesus?
Para muitos, o nome de Jesus é uma senha que abre os cofres do céu, ou uma chave que abre o coração de Deus. O nome de Jesus se torna como que uma “fórmula mágica”. Na realidade, a falta de um entendimento correto do que significa orar em nome de Jesus, tem sido fator determinante de tanta confusão com respeito a oração. Orar em nome de Jesus é orar a vontade dele, e orar a oração dele é orar junto com Ele. Vejamos ainda o que Bonhoeffer afirma a este respeito: “A verdadeira oração é, portanto, a palavra do Filho de Deus, que vive conosco, dirigida a Deus o Pai na eternidade.” [5] Os verdadeiros mestres da oração nos ensinam esta verdade, só podemos orar juntamente com Jesus. Nossas orações devem ser conseqüência da palavra de Deus que deve habitar ricamente em nosso coração desordenado. Devemos sempre nos perguntar: Jesus faria a oração que estou fazendo? Será que estou orando em seu nome, ou em meu próprio nome? As minhas orações são antropocêntricas ou Teocêntricas? Estou desejoso de que o nome de Deus seja santificado na terra? Que o seu reino cada vez mais seja uma realidade cada vez maior em minha vida, em minha casa e na sua igreja? Estou desejoso de que a sua vontade seja manifestada através da vida do seu povo aqui e agora? Quando examinamos nos evangelhos a vida de Jesus, percebemos que este sempre foi o seu desejo, a santificação do nome do seu pai, a manifestação do Reino de Deus na terra, e chegou mesmo a afirmar que a sua comida e a sua bebida era fazer a vontade de Deus. Que Deus nos dê graça para amarmos a sua vontade e que as nossas orações cada vez mais sejam determinadas pelo conceito que temos do plano eterno de Deus.
Orando segundo a vontade de Deus 

A eficácia da nossa oração, não está na quantidade de oração que fazemos, mas sim o quanto as nossas orações estão de acordo com a vontade de Deus. Muitas vezes, pensamos: Se Deus é soberano e a sua vontade será feita, será que a oração tem algum valor? Pois como sabemos, Deus jamais fará qualquer coisa contra a sua própria vontade. Poderíamos perguntar: Se é da sua vontade realizar algo, porque necessitamos orar? Se não orarmos, Ele não irá realizar a sua vontade? Se isto é verdade, será que a vontade de Deus está limitada por nossas orações?
A Bíblia nos ajuda a compreender o mistério da oração, pois ela deixa bem claro que o Deus que determina os fins também determina os meios pelos quais a sua soberana vontade será realizada. Portanto, a verdadeira oração não é um meio para fazer Deus concordar conosco, mas um meio para desejarmos e orarmos a vontade de Deus. Deus poderia cumprir sua vontade sozinho, mas preferiu nos incluir no seu plano. Assim como a pregação da palavra de Deus é um meio para que os eleitos sejam salvos, assim também a oração é um meio para que a vontade de Deus seja feita. O próprio Jesus nos ensinou a orar: “Seja feita a tua vontade assim na terra como no céu”. A verdadeira oração aqui na terra, nada mais é do que o expressar a vontade de Deus no céu. A oração não altera o que Deus já determinou, mas é o meio de realizar o que já foi preordenado. Não é a terra que comanda os céus, como muitos pensam, mas os céus comandam a terra. Quando nossas orações são determinadas pela palavra de Deus, ele nos ouve. Veja o que diz João 15:7: “Se permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes, e vos será feito.” O Espírito Santo trabalha a palavra de Deus na nossa mente, mudando os nossos conceitos, e consequentemente, os nossos desejos, e então começamos a orar a vontade de Deus. I João 5:14 confirma esta verdade: “E esta é a confiança que temos para com Ele, que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve.” O ministério do Espírito Santo é realizar a vontade de Deus, jamais Ele irá contra o plano eterno e predeterminado por Deus. Romanos 8:26,27 nos esclarece que o desejo do Espírito é a vontade de Deus. “Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercedo por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que Ele intercede pelos santos.” Somente tendo a nossa mente renovada pela palavra de Deus é que seremos transformados, teremos os nossos desejos mudados, pois não pensamos o que pensamos porque desejamos o que desejamos, mas desejamos o que desejamos porque pensamos como pensamos. Somente a palavra de Deus pode mudar os nossos pensamentos para podermos crer que a vontade de Deus é boa, perfeita e agradável.
O segredo da oração: Saber ouvir
Por mais estranho que nos pareça, o grande segredo para orar corretamente é saber ouvir, e não, saber falar. Assim como uma criança aprende a falar por ouvir o seu pai falar, nós aprendemos a orar, quando aprendemos a ouvir o falar de Deus. Deus nos fala através de sua palavra. A bíblia é o falar de Deus a nós na pessoa de seu Filho, portanto ela deve ser a base principal de nossa oração. É muito importante aprendermos a orar e cantar a palavra de Deus. O salmo primeiro nos diz que o varão bem aventurado é aquele que tem prazer de meditar na palavra de Deus de dia e de noite. Para ouvir precisamos ficar em silêncio e querermos ouvir “quem tem ouvidos para ouvir ouça”. Se o pior cego é aquele que não quer ver, o pior surdo é aquele que não quer ouvir. O silêncio muitas vezes nos assusta, pois o que mais nos perturba não é o barulho de fora, mas o de dentro, e muitas vezes até buscamos barulho exterior para não ouvirmos o interior. Mas na realidade, há uma grande ligação entre o silêncio e a oração.
Oração é relacionamento
Deus é um ser relacional, e nos criou à sua imagem e semelhança, portanto o relacionamento é um fator primordial em nossa vida. O nosso relacionamento com Deus determina nossa saúde emocional, reorganiza nosso mundo interior e determina os nossos relacionamentos pessoais. Os dez mandamentos não são nada mais do que princípios de relacionamentos. Os quatros primeiros são princípios para nos relacionarmos com Deus, e os seis últimos, princípios para nossos relacionamentos com o próximo. Orar nada mais é do que relacionamento com Deus, é um encontro pessoal e íntimo, que nos transforma cada vez mais à mesma imagem dele. II Co 3:17,18.
Nossa oração não pode ter o objetivo de fazer Deus funcionar para nosso uso, como se ele fosse um computador ou um eletro-doméstico. A verdadeira oração tem como objetivo relacionamento e intimidade, como disse Clemente de Alexandria: “Orar é manter a companhia com Deus.” [6] Na verdade nós não nos realizamos com oração, mas em Deus. A oração é um meio, e não um fim em si mesma. A verdadeira oração cristã deve ser trinitária, isto é, orarmos ao Pai, através ou em nome do Filho, mediante o Espírito Santo.
Nunca devemos pensar na oração como um meio de conquistar nossos desejos desordenados. Tiago 4:3 nos diz: “Pedis e não recebeis porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres.” A falta de visão da oração como relacionamento nos conduz ao erro de procurar métodos e técnicas para extrairmos o máximo de Deus. Muitos cursos e ensinamentos de oração parecem nos ensinar como tirar o melhor proveito de Deus. Hoje, somos uma geração de consumo, temos uma mente secularizada, por isso a oração se transformou em um meio de resolver problemas e obter conquistas. Pensamos na oração como um meio de mudar a vontade de Deus. Soren Kierkegaard diz: “A oração não transforma Deus, mas transforma aquele que ora. Não oramos a fim de informar a Deus, como se ele ignorasse os eventos e aquilo que estamos pensando ou sentindo. Antes oramos dizendo: “seja feita a tua vontade”.”
O maior desejo de Deus não é nos dar coisas, mas o maior bem para nós na mente de Deus é nos conformar à imagem de seu Filho (Rm 8:28,29). Somente através desta transformação é que encontraremos nossa verdadeira humanidade, pois a intimidade com Deus nos libertará de nossas trevas interiores e deixaremos de ser superficiais. A superficialidade é a maldição da nossa geração, somos obcecados pelo exterior, somos colecionadores de coisas, e acabamos por nos “coisificar”. Temos medo da oração, porque temos medo de nos conhecer, pois na luz de Deus temos luz, e diante da luz tudo se manifesta. Orar é estar nu diante de Deus, é estar vazio, totalmente dependente da graça. Orar é reconhecer nossos limites, nossa finitude, e reconhecer que somos barro nas mãos do oleiro. Orar é uma demonstração de fé. James Houston diz: “Viver sem orar é finalmente desacreditar de Deus, é perder de vista os mais importantes valores humanos, tal como a fé, a esperança e o amor.” [7]
Na oração enfrentamos uma verdadeira batalha espiritual: usar Deus para fazer a nossa vontade, ou render-nos à vontade do Pai. Na oração buscamos graça para crermos que a vontade de Deus é boa, agradável e perfeita. Quando deixamos o terreno da graça, corremos o risco de, baseados em nossa própria justiça, orarmos como o fariseu de Lucas 18:11: “Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais...”, e mal sabia ele que orava de si para si, e não foi justificado. Deus usa sua palavra e nossos momentos de oração para esquadrinhar nosso coração e nos revelar nossos motivos distorcidos, nossas trevas interiores. Deus não se relaciona conosco com intenções utilitárias ou para nos fazer funcionar, mas também não permite que nos relacionemos com Ele assim.
O Espírito e a oração 

A Bíblia afirma que nós não sabemos orar como convém, mas que o Espírito Santo intercede por nós com gemidos inexprimíveis (Rm 8:26,27). A verdadeira oração não está baseada em nosso intelecto, mas em um coração quebrantado e contrito. Quando oramos somente com nosso intelecto, somos tentados a dar direção a Deus, a aconselhá-lo como agir. Mas Deus pelas suas muitas misericórdias usa vários meios para nos quebrantar, para tratar com nosso coração altivo. Muitas vezes, nos coloca em túneis escuros para que aprendamos a orar de verdade, para nos ensinar a depender do Espírito Santo. Geralmente nestas horas de profundas crises, nossa boca se cala, mas nosso coração se abre; nossos ouvidos se aguçam e nós paramos de ensinar a Deus, e nos colocamos como aprendizes, como aconteceu com Jó: “Quem é aquele, como disseste, que sem conhecimento encobre o conselho? Na verdade falei do que não entendia, coisas maravilhosas demais para mim, coisas que eu não conhecia..., Eu te perguntarei, e tu me ensinarás.” (Jó 42:3). O propósito final de Deus foi levar Jó a uma intimidade de relacionamento, não apenas ter informações sobre Deus, não apenas ouvir falar de Deus, mas ver a Deus; e quando isso acontece, quando através da intimidade nós começamos a ter uma revelação real de Deus, nossa reação é semelhante a de Jó, diante de tanta sabedoria e poder, só nos resta nos abominarmos e nos arrependermos no pó e na cinza; e por incrível que pareça, é um momento de terror, mas de profunda alegria também, muitas vezes de medo, mas de plenitude, pois aprendemos que orar é intimidade, é andar com Deus, é um relacionamento amoroso, que nos gera uma real alegria, e como diz o Senhor: “Mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em me conhecer e saber que sou o Senhor e faço misericórdia, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o Senhor” (Jr 9:24).
Nesta escola da oração nós nunca nos diplomamos, mas pelo contrário, cada vez mais clamamos: “Ensina-nos a orar”.

A vontade de Deus

A Vontade de Deus


Ao tratar da Vontade de Deus alguns teólogos têm diferenciado entre Sua vontade decretiva e Sua vontade permissiva, insistindo que há certas coisas que Deus tem positivamente pré-ordenado, mas outras coisas que Ele meramente tolera existir ou acontecer.

Antigos Calvinistas  adotam entre a vontade secreta e revelada de Deus, ou, para expressar de uma outra forma, Sua vontade dispositiva e preceptiva.

 A vontade velada de Deus é feita conhecida em Sua Palavra, mas Sua vontade secreta são Seus próprios conselhos encobertos.

 A vontade revelada de Deus é o definidor de nosso dever e o padrão de nossa responsabilidade. A primária e básica razão pela qual eu devo seguir certo curso ou fazer certa coisa é por causa da vontade de Deus, a Sua vontade sendo claramente definida para mim em Sua Palavra. Que eu não deveria seguir um certo curso, que eu devo me abster de fazer certas coisas, é porque elas são contrárias à vontade revelada de Deus. Mas suponha que eu desobedeça a Palavra de Deus, então, eu não contrario Sua vontade? E se é assim, como pode ainda ser verdade que a vontade de Deus sempre é feita e Seu conselho consumado todas as vezes? Tais questões fazem evidente a necessidade de se defender uma distinção aqui. A vontade revelada de Deus é freqüentemente contrariada, mas  sua vontade secreta  nunca é frustrada. Que é legítimo fazermos tal distinção concernente à vontade de Deus, é clara a partir das Escrituras. Tome esta duas passagens: "Porque esta é a vontade de Deus, a saber, a vossa santificação: que vos abstenhais da prostituição" (1 Tessalonicenses 4:3); "Dir-me-ás então. Por que se queixa ele ainda? Pois, quem resiste à sua vontade?" (Romanos 9:19). Pode um leitor pensativo declara que a "vontade" de Deus tem precisamente o mesmo significado em ambas dessas passagens? Nós seguramente esperamos que não. A primeira passagem refere-se à " vontade revelada " de Deus, a última à Sua  "vontade secreta" . A primeira passagem concerne a nosso dever, a última declara que o propósito secreto de Deus é imutável e deve acontecer não obstante a insubordinação das Suas criaturas. A vontade revelada de Deus nunca é perfeitamente ou completamente realizada por alguém de nós, mas Sua vontade secreta nunca falha na consumação até mesmo no mais minucioso detalhe. Sua vontade secreta concerne principalmente a eventos futuros; Sua vontade revelada, nosso dever presente: uma tem que ver com Seu irresistível propósito, o outro com Seu agrado manifestado: uma é elaborada sobre nós e realizada através de nós, a outra é para feita por nós.

 A vontade secreta de Deus é Seu eterno, imutável propósito concernente a todas as coisas que Ele fez, para produzir certos meios para seus fins apontados: disto Deus declara explicitamente: "Meu conselho subsistirá, e farei toda Minha vontade" (Isaías 46:10). Esta é a absoluta, eficaz vontade de Deus, sempre efetuada, sempre realizada. A vontade revelada de Deus contêm não Seu propósito e decreto, mas nosso dever, - não o que Ele fará de acordo com Seu eterno conselho, mas o que nós deveríamos faze se quiséssemos agradá-LO, e isto é expresso nos preceitos e promessas de Sua Palavra. O que quer que Deus tenha determinado consigo mesmo, seja para Ele próprio fazer, ou para fazer pelos outros, ou tolerar que seja feito, enquanto isto está em Seu próprio seio, e não foi feito conhecido por algum evento na providência, ou por preceito, ou por profecia, é Sua vontade secreta. Tais são as coisas profundas de Deus, os pensamentos de Seu coração, os conselhos de Sua mente, que são impenetráveis para todas criaturas. Mas quando estas coisas são feitas conhecidas, elas tornam-se Sua vontade revelada: tal é quase todo o livro do Apocalipse, no qual Deus tem feito conhecido a nós "coisas que brevemente devem acontecer" (Apocalipse 1:1 - "deve" porque Ele eternamente propôs que deveriam acontecer).



Tem sido objetado pelos teólogos Arminianos que a divisão da vontade de Deus em secreta e revelada é insustentável, pois ela faz com que Deus tenha duas vontades diferentes, uma oposta a outra. Mas isto é um engano, devido a falha deles em ver que a vontade secreta e revelada de Deus dizem respeito a objetos inteiramente diferentes. Se Deus requeresse e proibisse a coisa, ou se Ele decretasse que a mesma coisa aconteceria ou não, então Sua vontade secreta e revelada seria contraditória e sem propósito. Se aqueles que objetam à vontade secreta e revelada de Deus como sendo inconsistentes, fizessem a mesma distinção neste caso que eles fazem em muitos outros casos, a aparente inconsistência imediatamente desapareceria. Quão freqüentemente os homens traçam uma astuta distinção entre o que é desejável em sua própria natureza, e o que não é desejável considerando todas as coisas. Por exemplo, o pai carinhoso não deseja simplesmente considerar punir seu filho ofensivo, mas, considerando todas as coisas, ele sabe que este é o seu dever obrigatório, e assim corrige seu filho. E embora ele conte ao seu filho que ele não deseja castigá-lo, mas que ele está certo que isto é o melhor ao fazer considerando todas as coisas, então um filho inteligente verá que não há inconsistência entre o que o pai diz e faz. Exatamente assim o Criador Todo-sábio pode consistentemente decretar acontecer coisas que Ele odeia, proibir e condenar. Deus escolhe que algumas coisas existem que Ele odeia completamente (na intrínseca natureza delas), e Ele também escolhe que algumas coisas, todavia não existam, as quais Ele ama perfeitamente (na intrínseca natureza delas). Por exemplo: Ele ordenou que Faraó deixasse Seu povo ir, porque isso era justo na natureza das coisas, todavia, Ele secretamente havia declarado que Faraó não deveria deixar o Seu povo ir, não porque era justo em Faraó recusar, mas porque era melhor considerando todas as coisas que ele não os deixasse ir - isto é, melhor porque favoreceu um propósito mais amplo de Deus.

Novamente Deus nos manda sermos perfeitamente santos nesta vida (Mateus 5:48), porque isto é justo na natureza das coisas, mas Ele decretou que nenhum homem será perfeitamente santo nesta vida, porque é melhor, considerando todas as coisas, que ninguém seja perfeitamente santo (experimentalmente) antes de deixar este mundo. Santidade é uma coisa, o acontecimento da santidade é outra; assim, pecado é uma coisa, o acontecimento do pecado é outra. Quando Deus requer santidade, Sua vontade preceptiva ou revelada considera a natureza ou excelência moral da santidade; mas quando Ele decreta que a santidade não ocorra (completa e perfeitamente), Sua vontade secreta ou decretiva considera somente o evento de que ela não ocorre. Assim, novamente, quando Deus proíbe o pecado, Sua vontade preceptiva ou revelada considera somente a natureza ou o mal moral do pecado; mas quando Ele decreta que o pecado ocorrerá, Sua vontade secreta considera somente sua real ocorrência para servir o Seu bom propósito. Portanto, a vontade secreta e revelada de Deus considera objetos inteiramente diferentes.

 
vontade do decreto de Deus não é a Sua vontade no mesmo sentido como Sua vontade de mandamento é. Portanto, não há dificuldade em supor que uma possa ser contrária à outra. Sua vontade, em ambos sentidos, é Sua inclinação. Tudo que concerne a Sua vontade revelada é perfeitamente de acordo com Sua natureza, como quando Ele ordena amor, obediência, e serviço de Suas criaturas. Mas o que concerne a Sua vontade secreta tem em vista Seu fim supremo, para o qual todas as coisas estão agora operando. Portanto, Ele decreta a entrada de pecado no Seu universo, embora Sua própria natureza santa odeie todo pecado com infinita repulsa, todavia, porque este é um dos meios pelos quais Ele apontou o fim para ser alcançado, Ele tolera a entrada dele. A vontade revelada de Deus é a medida de nossa responsabilidade e o determinante de nosso dever. Com a vontade secreta de Deus nós não temos nada para fazer: esta é de Sua incumbência. Mas Deus, sabendo que falharemos em fazer perfeitamente Sua vontade revelada, ordenou Seus eternos conselhos conseqüentemente, e estes eternos conselhos, que aconteça Sua vontade secreta, embora desconhecida para nós, embora inconscientemente, cumprida em e através de nós.

Se o cristão está preparado ou não para aceitar a distinção acima na vontade de Deus, ele deve reconhecer que os mandamentos das Escrituras declaram a vontade revelada de Deus, e ele deve também aceitar que algumas vezes Deus não quer impedir a quebra daqueles mandamentos, porque Ele na realidade não o impede. Que Deus quer permitir o pecado é evidente, porque Ele o permite. Certamente ninguém dirá que o próprio Deus faz o que Ele não quer fazer.

Finalmente, ixe-me dizer novamente que, minha responsabilidade em relação à vontade de Deus é medida pelo que Ele fez conhecido na Sua Palavra. Ali eu aprendo que é meu dever usar os meios de Sua providência, e humildemente orar para que Ele possa Se agradar em abençoá-los para mim. Recusar assim fazer sobre o fundamente de que eu sou ignorante do que possa ou não possa ser Seus conselhos secretos concernentes a mim, não somente é um absurdo, mas também o ápice da presunção. Nós repetimos: a vontade secreta de Deus não nos diz respeito; é Sua vontade revelada que mede nossa responsabilidade. Que não há conflito entre a vontade secreta e revelada de Deus é claro a partir do fato que, a primeira é realizada pelo meu uso dos meios registrados na última.